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GOIÁS: Em 24 horas, 78 supostas vítimas de João de Deus procuram MP

Na segunda-feira (10) o Ministério Público de Goiás (PM-GO) divulgou e-mail para concentrar recebimento de denúncias.

(Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil)
Apenas 24 horas após anunciar, por meio da imprensa, a criação de um endereço eletrônico para receber denúncias de supostas vítimas de crimes sexuais atribuídos ao médium João de Deus, o Ministério Público de Goiás (MP-GO) já foi contactado por 78 mulheres.

João de Deus (Foto: TV Globo / Reprodução)
O e-mail denuncias@mpgo.mp.br foi uma das medidas anunciadas ontem (10), pelos promotores que integram a força-tarefa criada pelo MP estadual para apurar as acusações que não param de surgir desde que os primeiros casos vieram a público em um programa de televisão, exibido na sexta-feira (7). A força-tarefa é composta por cinco promotores – que atuarão em conjunto com os coordenadores dos Centros de Apoio Operacional Criminal de outras unidades da federação e dois psicólogos

As mulheres que buscaram orientação até as 11h de hoje se identificaram como sendo de Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Mato Grosso. Após a análise preliminar das informações fornecidas, elas poderão ser convidadas a prestar depoimento a promotores dos estados em que residem.

Além do e-mail, as possíveis vítimas podem procurar o MPGO por telefone (62-3243-8051 e 8052) ou presencialmente.

Sistematização de denúncias
Ontem, o coordenador do Centro de Apoio Operacional (CAO) Criminal do Ministério Público, Luciano Miranda Meireles, afirmou que depoimentos deveriam começar a ser tomados em São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, além de Goiás, na medida em que denúncias começassem a surgir.

“Cada estado está recebendo ligações e e-mails de vítimas, mas isso ainda não está sistematizado. Precisamos que as vítimas procurem o MP para prestar depoimento. Só quando tivermos esses depoimentos em mãos poderemos falar em números. Até então, temos ligações, e-mails, mas não o que precisamos, que é [o fato] concreto”, disse Meireles, nesta segunda-feira (11). Na ocasião, os promotores criminais goianos ainda não haviam recebido novas denúncias formais.

Segundo Meireles, no entanto, denúncias anteriores contra João de Deus já haviam sido apuradas. Segundo o coordenador do CAO, na ocasião, o MP requisitou à Polícia Civil a instauração de um inquérito policial. “Isso é a praxe. Não temos condição de investigar todas as situações. E, no caso, uma requisição do MP equivale a uma ordem”, acrescentou o promotor, revelando que, hoje à tarde, os membros da força-tarefa se reunirão com o delegado-geral André Fernandes para saber como andam as investigações dos casos anteriores.

Mesmo com denúncias, centro de João de Deus manterá atendimentos
As denúncias de que teria abusado sexualmente de dezenas de mulheres que buscaram tratamento espiritual na Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia (GO), “entristeceram” o médium João de Deus, mas não a ponto de fazê-lo desistir de atender as milhares de pessoas que, semanalmente, o procuram na pequena cidade a cerca de 110 quilômetros de Brasília.

Cinco dias após o programa Conversa com Bial, da TV Globo, exibir os primeiros depoimentos de mulheres que afirmam ter sido vítimas de crimes sexuais praticados pelo médium, os funcionários do centro espírita preparam o local para o atendimento previsto para esta quarta-feira (12). Segundo assessores, João de Deus atenderá normalmente pelos próximos três dias.

“Ele está triste, mas está bem. E, no momento certo, vai falar [sobre as denúncias]”, comentou Edna Gomes, assessora de imprensa da Casa Dom Inácio de Loyola. Segundo ela, o médium já chorou diante da repercussão das notícias, mas está convencido de que esclarecerá os fatos.

Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia (GO)
Para a assessora, os depoimentos das mulheres parecem conter inúmeras “inconsistências” que precisam ser apuradas. Ao mostrar as instalações do centro espírita a jornalistas, que chegam à cidade para acompanhar os desdobramentos dos fatos, Edna garantiu que João de Deus não atende ninguém individualmente, em ambiente separado. “O seu João sempre foi um homem muito respeitador. Conhecendo-o, você percebe que há coisas impossíveis [nos relatos]. Ele mesmo diz que nunca foi santo, mas, neste sentido, não há nada [que o desabone]”, disse Edna, lembrando que o médium já foi inocentado de denúncias anteriores semelhantes.

“A última vez que falei com ele foi ontem. Ele está chateado, claro, mas está bem. É muita coisa ao mesmo tempo”, afirmou Francisco Lobo, um dos secretários da casa. Dizendo ainda estar se inteirando dos fatos, Lobo classificou as denúncias como um “absurdo”. “Vamos ter que esperar peneirar para ver o que fica [das denúncias]”, acrescentou o secretário, que já foi vice-prefeito da pequena cidade de cerca de 12 mil habitantes e, hoje, atua com voluntário da estrutura montada ao redor do médium.

Abadiânia
Segundo Lobo, além das curas e aconselhamentos espirituais, a Casa Dom Inácio de Loyola se dedica também ao trabalho social. Mantém a chamada Casa da Sopa, onde, além de refeições aos mais pobres e necessitados, oferece atendimento odontológico e outros serviços à população carente, doando material escolar e alimentos. Além disso, a existência do centro espírita movimenta a economia local, com hotéis, bares, restaurantes e pousadas funcionando apenas para atender turistas estrangeiros e brasileiros de outras regiões do país.

“A renda per capita do município praticamente depende do João. Há 83 pousadas em funcionamento, algumas com até 200 quartos. Enquanto a cidade tem pouco mais de 12 mil moradores, a população flutuante mensal ultrapassa 20 mil pessoas. São entre 3 mil e 5 mil atendimentos semanais”, afirmou Lobo, explicando parte da razão do “carinho” que parte da população local sente por João de Deus.

De acordo com o secretário, a casa que funciona há 40 anos no mesmo local e tornou Abadiânia famosa internacionalmente funciona com 40 funcionários com vínculos empregatícios e 30 voluntários assíduos, mais aqueles que aparecem esporadicamente. “Eu sou mais um. O fluxo é muito grande e é preciso termos gente”. Gente que, segundo Lobo, professa todas as fés e vêm de todas as partes do mundo. “Eu mesmo continuo católico. Aqui não se professa religião. É um lugar ecumênico. Há budistas, evangélicos, enfim, de todas as religiões e nacionalidades”.

De fato, nas imediações do centro, é grande a presença de estrangeiros. Na manhã de hoje, o salão de café do hotel mais próximo da Casa Dom Inácio de Loyola estava tomado por franceses. Nas ruas, é possível ouvir pessoas conversando em inglês, alemão e espanhol. Lobo garante que, cerca de 25% dos frequentadores são estrangeiros, o que daria uma média de 5 mil pessoas vindas do exterior. Justamente as que costumam permanecer mais tempo na cidade e movimentar a economia local.

De acordo com a funcionária de uma pousada que pediu para não ser identificada, a maioria dos brasileiros costuma chegar na quarta-feira, cedo, e em grupo. Os atendimentos acontecem pela manhã e pela tarde. Enquanto a reportagem da Agência Brasil circulava pela cidade, um ônibus de Santa Maria (RS) chegou com cerca de 40 passageiros que vieram conhecer a casa de atendimento espiritual.

Para Edna e Lobo, os promotores da força-tarefa criada pelo Ministério Público de Goiás podem ter se precipitado ao anunciar que a mera denúncia, em caso de crimes sexuais, pode ser o suficiente e que não descartam a hipótese de pedir o fechamento do centro espírita. “Eu só acho que a Casa não tem nada que ver com isso. A Casa é uma igreja. Você vai fechar uma igreja? Agora, se você quer tirar o padre, o pastor, tudo bem, [que se apure os fatos], mas a igreja é a igreja.”


Da Agência Brasil

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